quinta-feira, 14 de julho de 2011

Esse texto venceu o sétimo concurso de expressão literária aqui da cidade (jlle).
Texto de Marinaldo de Silva e Silva, primeiro lugar na categoria Conto/Crônica do 7º Prêmio Joinville de Expressão Literária.

As tatuagens, todas, estão ao dentro. Derrapam em letras menores, desenham-se através delas sem lente de aumento. No começo são cimentadas, duras, mas logo ficarão maleáveis, e virarão inspiração. Escaparão pelas mãos, signos num papel, numa parede, serão redes pescando alegorias, fazendo pequenas atrofias na lembrança. Misturar-se-ão na memória, umas palavras conhecidas, outras inventadas, todas atrevidas à gloria de deixarem o rascunho para procurar o ouro, a jóia da poesia virando poema, um verso tirado dum colar de fonemas preso no pescoço de um gênio, para adentrar numa lâmpada quase nunca acesa dentro de um baú sempre incompleto.
Dado a reciclar as idéias, vai de aldeia em aldeia garimpando ensaios de comédia e drama, pretensões de luz e linho. Esmerilha a métrica da dor e o cálice do desalinho. Sobrevoa o côncavo do amor, tenta escrever um romance de velhas cartas, todas fartas de serem tortas, e mortas, e que nas mãos do poeta míngua, pena, chora, dilacera, e ginganum azul de estrelas adormecidas e acinzentadas. Então separa a superfície, imerge, tentando achar a resposta, a que veda e secreta e, quando se abre, seja discreta ao fazedor de presságios, que é o poeta.
O corpo do poeta se divide em antes e depois da escrita. Antes é o pensamento, o maremoto de instâncias, de palavras de infância e de ser velho. Depois da escrita é a comoção da dúvida, o alerta do rascunho sem arestas, sem poeiras e pontas, só tontas idéias. E esse corpo de ser corpo sente, absorve a acidez e o aroma, e ao contente desagrada, porque hipnotiza a escolha e faz da bolha de sabão, alguma coisa que intercalando o céu, estoura, oxidando o chão.
E se a poesia desaparece, o poeta vai com ela. Não adianta janela ou porta que o acoroçoe, não adianta nenhuma planta endêmica, nenhum estratagema para resgatá-lo. O corpo do poeta sem poesia some. Vira apenas um homem exercitando uma mentira, uma piada invertida, antes da risada. Quando a poesia vai embora, o olhar rejeita a imagem, e fica cego das mesmas coisas, e vendo tudo como o tudo é, enterra-se na incapacidade de dar à palma da mão o plano do pé, e o poeta vira apenas mais um bípede. E passa a ser, só o que é.

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